Noite de jogo grande com o primeiro clássico do campeonato em Alvalade, um Sporting-Porto e a promessa de drama e de polémica servidos de bandeja.
Tal como Rui Borges interrompeu a sua série de invencibilidade, eu interrompo as minhas férias para vos dar a ler este texto. Assim não sou só eu que perco tempo.
A plateia leonina chegou com esperança, mas depressa ficou com aquela sensação de que o jantar podia vir sem sobremesa. Rui Borges apareceu com o fato de gala, daqueles comprados em saldos de meia estação e um discurso cheio de confiança.
No lado azul, estava Farioli, o italiano zen que aterrou no Porto com ares de filósofo moderno. Chegou a Lisboa com o cabelo arrumadinho, sorriso descontraído e a tranquilidade de quem acredita que um clássico é só mais um treino, mas com mais câmaras a filmar. Se Borges estava ali para provar que era treinador de equipa grande, Farioli parecia apenas interessado em provar que os dragões já tinham yoga mat reserva em Alvalade.
O que se esperava de um clássico era garra, choque, intensidade e foi o que se teve. Ainda alguns procuravam o lugar e já o Borja Sainz enviava uma bola ao poste. Estava feito o “teaser” do que viria mais tarde.
O Sporting até tentou assumir a iniciativa, mas a iniciativa parecia estar de férias no Algarve. Huljmand e companhia movimentavam-se, mas era como procurar rede de telemóvel numa cave ou como eu neste momento no Alentejo, nada de sinal. O FC Porto, por sua vez, vinha tranquilo, como quem diz:
“Não precisamos marcar já, eles eventualmente irão mais tarde ajudar.”
O relvado parecia assistir em silêncio a uma batalha entre dois conjuntos de jogadores que não queriam cometer erros. Resultado? Zero golos, zero riscos mas muita emoção. Bola lá, bola lá num jogo de futebol que parecia ténis mas sem “match point”.
A primeira parte terminou estilo vésperas de um exame nacional de Filosofia, com muitas dúvidas sobre como seria a segunda parte, algumas frases decoradas mas de difícil interpretação.
A segunda parte foi melho mas para o FC Porto. Logo aos 61 minutos, Luuk de Jong estrei-se a marcar, o holandês que parece ter sido contratado apenas para estragar tardes sportinguistas, apareceu solto na área e rematou para o 0–1. Foi como ligar o despertador depois de uma sesta demasiado longa, acordou toda a gente no estádio e os sportinguistas começaram a ficar com aquela sensação de Bloco de Esquerda após os primeiros resultados das últimas eleições.
O Sporting ainda tentava perceber de onde tinha vindo o golpe quando, três minutos depois, William Gomes resolveu mostrar que também queria entrar nos momentos marcantes da semana. Pegou na bola e imitando Ricardo Salgado fez magia, não desapareceu com milhões mas fez um golão que pode vir a valer milhões.
Foi tudo tão rápido que parecia replay acelerado. Rui Borges, no banco, ficou com a cara de quem descobre que o frigorífico está vazio depois de prometer jantar a amigos.
A partir daí, o FC Porto geria com tranquilidade e até parecia capaz de mais. Mas o Sporting também queria deixar a sua marca… e até conseguiu. Nehuén Pérez, com a delicadeza de um convidado que parte a loiça toda no jantar de família, meteu a bola na própria baliza e ofereceu um golo ao adversário.
O golo do argentino fez 1–2 e lançou a esperança entre os leões mas como diz o famoso treinador Ted Lasso, é a esperança que nos mata. O FC Porto não tremeu, limitou-se a segurar a vantagem com calma e sabedoria, enquanto os leões se debatiam com a falta de ideias. A bola circulava, mas parecia que ninguém sabia bem para onde. Rui Borges gritava na linha lateral, Farioli gesticulava como maestro de orquestra… e o relógio foi andando até ao fim.
No fim, o FC Porto sai de Alvalade com três pontos na mala e a liderança isolada do campeonato. Quatro jogos, quatro vitórias, estatuto de candidato assumido. Farioli, no rescaldo, ainda sorriu como quem acabou de vencer uma partida de xadrez sem sequer perder um peão ou um jogador.
Do lado leonino, Rui Borges sentiu na pele o peso da derrota em clássicos. Não foi um descalabro, mas também não foi uma exibição que inspire confiança. Não há campeões em Agosto mas duas derrotas com os dois rivais num espaço de um mês parece um regresso a um passado do qual os leões não têm muitas saudades.
As bancadas esvaziaram-se num misto de frustração e resignação. Os adeptos sabiam que o campeonato ainda é longo, mas a piada ficou feita: “Até quando o Sporting marca… o golo é para o Porto.”
Assim terminou o clássico, espetáculo na primeira parte, drama na segunda e com uma conclusão que resume bem o futebol português, lógica não é coisa que lhe assista.
Viva o Futebol